A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2012
Autor(a) principal: Sampaio Neto, Bruno Andrade de
Orientador(a): Câmara, Antônio da Silva
Banca de defesa: Moura, Mauro Castelo Branco de, Cardel, Lídia Maria Pires Soares, Câmara, Antônio da Silva
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas
Programa de Pós-Graduação: Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
Departamento: Não Informado pela instituição
País: brasil
Palavras-chave em Português:
Área do conhecimento CNPq:
Link de acesso: http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/14917
Resumo: A idéia para a presente pesquisa surgiu como um caminho natural da minha trajetória acadêmica que em determinado momento encontrou nas discussões da Sociologia da Arte os anseios intelectuais de um aspirante a sociólogo fascinado pelo universo artístico e os seus magníficos mistérios. Ingressar no projeto de pesquisa chefiado pelo professor Antônio Câmara (que tinha como objetivo analisar sociologicamente filmes brasileiros de temática rural) foi um divisor de águas nos meus anos de graduação na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA. O enriquecedor contato com este grupo levou-me a cursar a disciplina Sociologia da Arte, onde se confirmou uma inclinação pessoal para o estudo referente aos conteúdos da sociologia da literatura. Devido ao teor notavelmente crítico dos seus escritos, Kafka logo surgiu como um objeto de análise promissor. Depois de muito debate definimos que a melhor direção a ser tomada na composição da minha monografia seria buscar interpretar o romance O Processo à luz do conceito de alienação desenvolvido por Marx. A metodologia construída para dar conta desse objetivo mostrou-se bastante eficaz e posso dizer que o trabalho foi muito bem recebido. Para a dissertação, portanto, resolvemos manter Kafka como objeto de estudo, mas faltava ainda decidir sob qual perspectiva iríamos abordar o autor desta vez. Não demorou muito para percebermos que um dos elementos mais significativos da sua literatura era ao mesmo tempo um tema sociológico por excelência: a burocracia – e o romance O Castelo seria o mais adequado para essa abordagem. Seguindo uma orientação teórica marxista podemos observar a rica possibilidade de diálogo entre essa obra e a discussão da escola de Frankfurt em torno da razão subjetiva. Para tornar o nosso referencial teórico mais completo optamos por realizar uma discussão sobre a Razão no pensamento de Hegel, com a intenção de construir um pano de fundo filosófico que nos ajude a compreender melhor as ponderações empreendidas por Adorno e Horkheimer na crítica desses autores às sociedades modernas. Mesmo partindo de uma perspectiva distinta da weberiana sobre a sociedade capitalista, nos pareceu adequado dialogar criticamente com este autor para compreendermos o processo de racionalização ocorrido nos países ocidentais, assim como o fortalecimento da dominação burocrática nessas culturas. Além disso, ampliamos o debate a respeito da sociologia da literatura em Lukács, Goldmann e outros autores no intuito de aprofundar a nossa abordagem estética em relação ao que já havíamos feito no trabalho de conclusão de curso. Conscientes das dificuldades dessa empreitada nos lançamos no desafio de mais uma vez adentrarmos o estranho universo literário de Kafka. Levando em consideração as peculiaridades do nosso objeto de estudo, acreditamos ser necessária a realização de algumas reflexões preliminares importantes. Para que a posição desta pesquisa não pareça nebulosa quanto ao seu conteúdo propriamente artístico, é preciso dizer que compartilhamos do postulado apresentado por Arnold Hauser na obra The Philosophy of Art History (1985), de que todo tipo de arte é invariavelmente condicionado pelo meio social no qual surgiu, mas que, por outro lado, nem tudo numa obra de arte pode ser compreendido utilizando o viés sociológico. Se nos propomos a analisar uma obra literária à luz de conceitos da Sociologia, não podemos em hipótese alguma, perder de vista o fato da arte produzir um conhecimento sensível, no qual a subjetividade e a individualidade são fundamentais. Logo os seus resultados não são similares àqueles produzidos pela ciência, pois eles não constituem conceitos. O que não impede a ciência de se debruçar sobre estes, respeitando sua singularidade, mas buscando apreendê-los no âmbito da totalidade social. Temos plena consciência de que deixar de lado tal fator significa negar à obra que se pretende estudar aquilo que ela possui de mais característico, quer dizer, a sua personalidade estética, que se relaciona com o homem num nível bastante distinto daquele alcançado pela ciência através dos procedimentos discursivos. Reconhecer que o fenômeno artístico, dado a sua indiscutível complexidade, só pode ser parcialmente apreendido pelo conhecimento cientifico, não quer dizer que estejamos querendo lhe atribuir um caráter místico ou fetichizado, e sim que procuramos evitar o empobrecimento da análise admitindo a especificidade desta manifestação. Em contrapartida, durante uma determinada época tornou-se um procedimento comum a diversos estudiosos desta forma de expressão, acreditar que a história da arte se desenvolve de maneira independente dos movimentos da história humana. Por mais que seja errôneo interpretá-lo como um mero reflexo da sociedade, não há como negar que a arte é um aspecto integrante e ativo da história geral do homem. Se subtrairmos completamente a atividade artística do âmbito da história, estaremos fatalmente atribuindo-lhe um caráter abstrato, quase sobrenatural, quando na verdade acreditamos na existência de ligações objetivas entre estas duas instâncias. Encarar a arte livre de qualquer influência que não tenha surgido do seu próprio movimento, leva à idéia de que a melhor maneira de analisá-la seja investigando a personalidade do seu criador. Porém, a psicologia vem se mostrando insuficiente para a compreensão do fenômeno artístico. Uma investigação que tenha o objetivo de compreender como estão estruturadas as condições materiais da época em que o artista viveu nos parece muito mais frutífera do que o complicado desvendamento das suas intenções subjetivas. Por este motivo acreditamos que o procedimento mais acertado para a análise deste objeto seja aquele que procure apreender como as condições objetivas refletem-se nos homens historicamente situados e de que maneira isso se transmite ao próprio ato da criação artística. Essa discussão é essencial na medida em que compreender a arte apartada da história significa considerá-la isenta das influências do meio social. Leandro Konder nos lembra que se fosse desta forma este fenômeno provavelmente já teria desaparecido cedendo lugar à técnica, devido à importância que a burguesia atribui aos objetos úteis, o que certamente não corresponde ao caráter da arte. O debate serve também para justificar a nossa adoção do método de análise utilizado por Lukács, em especial no livro A Teoria do Romance. Lukács tinha conhecimento de que conteúdo e forma não devem ser compreendidos de modo inteiramente separado, mas ele foi muito além deste aspecto, enxergando a maneira com a qual o sistema capitalista burguês afeta justamente aquilo que mantém estas duas categorias integradas, ou seja, a consciência do artista. Ao analisar as formas literárias, de maneira especial o romance, este filósofo procurou observar os métodos utilizados pelos escritores do século XIX na composição de suas obras, enfatizando a existência de elementos objetivos imprescindíveis a esta composição que estão além da vontade individual do artista, dando ao cientista social algo sólido com que trabalhar. Seria este, portanto, o nosso ponto de partida metodológico. Chamamos atenção ainda, para o fato de a literatura guardar uma diferença bastante significativa em relação aos outros tipos de arte. Não é raro que em determinadas sentenças ou expressões encontremos separados o artista do escritor; o título do famoso livro de Hauser é um exemplo claro disso: História Social da Arte e da Literatura. Ao que sabemos esta separação se deve principalmente à forte presença do elemento discursivo no processo de criação estética de uma obra literária. Isso não quer dizer, contudo, que a análise científica de um romance seja de alguma maneira facilitada, pois na grande literatura o discurso se converte invariavelmente em um meio de expressar sensações que, sem o talento artístico do escritor, nunca seria devidamente atingido. Com isso em mente decidimos dividir o nosso trabalho em quatro capítulos, buscando abrigar a discussão necessária para a construção de um panorama teórico-metodológico que nos auxilie a estabelecer um diálogo entre o romance O Castelo e os autores citados acima. No primeiro capítulo buscaremos efetuar uma análise da biografia de Kafka, e das muitas interpretações a respeito da sua obra. Nossa finalidade é construir um painel que dê conta de elementos que consideramos importantes na sua vida, como a situação dos judeus em Praga e a conturbada relação deste escritor com seu pai, dando ênfase ao período em que o romance O Castelo foi escrito. Estes elementos são importantes, porém não serão determinantes na leitura da obra. Pretendemos também realizar um exame cuidadoso do contexto histórico no qual o escritor viveu, destacando os processos políticos, econômicos, e ideológicos que estavam em questão na Áustria do início do século XX. Ao ressaltar as principais tendências críticas da obra de Kafka, pretendemos, além de expor os prós e os contras de cada uma, situar também a nossa própria perspectiva, adiantando parte do procedimento metodológico. Já no capítulo dois temos como objetivo analisar o conteúdo referente à sociologia da literatura especialmente nas obras de Lukács, Goldmann e Adorno. Em sua conhecida obra A Teoria do Romance Lukács procurou mostrar as possibilidades de conexão entre uma compreensão do contexto histórico e o estudo estético das obras literárias. Como já dissemos anteriormente a metodologia aqui utilizada deve muito à contribuição desse autor para a análise literária. Anos depois Lucien Goldmann retoma as categorias trabalhadas por Lukács, buscando adaptá-las para a compreensão do chamado romance moderno. Ele propõe a hipótese sociológica de que existem ligações objetivas entre o modo de produção das sociedades e a estrutura dos romances. Com Adorno aprofundaremos a discussão sobre as mudanças ocorridas na composição deste estilo literário com a transição do capitalismo liberal para o imperialista. O terceiro capítulo por sua vez será dedicado à discussão teórica sobre a Razão, utilizando autores como Hegel, Adorno, Horkheimer e Weber. Dissemos como o primeiro nos dará uma base filosófica para compreender o movimento da razão: seu momento objetivo e a sua posterior subjetivação. A razão em Hegel caminha para uma unidade entre a razão objetiva e a subjetiva. Com Adorno e Horkheimer veremos os malefícios causados pela perda de objetividade deste conceito. Ao empreenderem uma crítica incisiva da modernidade e dos potenciais destrutivos da razão humana, eles mostraram como se tornou possível a atual crise de valores vivenciada pelas sociedades ocidentais. Mesmo assumindo o ponto de vista da razão subjetiva, Weber revelou aspectos bastante importantes do processo de desencantamento do mundo e da acelerada burocratização da realidade social. Porém, nesse sociólogo antes de termos uma discussão acerca da razão, vemos uma análise da racionalização. Chegamos por fim ao último capítulo no qual analisamos o romance O Castelo. Seguindo o método utilizado na monografia buscaremos eleger algumas passagens que consideramos pontos altos da narrativa de Kafka, avaliando-as à luz dos autores estudados nos capítulos anteriores. Este é o momento de efetuar uma triangulação dos elementos observados no nosso objeto, com as informações provindas das discussões teóricas (tanto no que se refere à razão quanto à sociologia da literatura), e as reflexões realizadas a partir da análise do contexto histórico. É importante observar também que o nosso ponto de partida é o próprio texto do romance, que será tratado com extremo cuidado pelas próprias peculiaridades da composição labiríntica desenvolvida pelo escritor de Praga. Com isso procuraremos evitar qualquer tipo de conclusão que tome como base informações não encontradas no corpo integral da obra.
id UFBA-2_6f817493c87a631f0a118956036976a7
oai_identifier_str oai:repositorio.ufba.br:ri/14917
network_acronym_str UFBA-2
network_name_str Repositório Institucional da UFBA
repository_id_str
spelling Sampaio Neto, Bruno Andrade deSampaio Neto, Bruno Andrade deCâmara, Antônio da SilvaMoura, Mauro Castelo Branco deCardel, Lídia Maria Pires SoaresCâmara, Antônio da Silva2014-05-06T14:09:45Z2014-05-06T14:09:45Z2014-05-062012-08-06http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/14917A idéia para a presente pesquisa surgiu como um caminho natural da minha trajetória acadêmica que em determinado momento encontrou nas discussões da Sociologia da Arte os anseios intelectuais de um aspirante a sociólogo fascinado pelo universo artístico e os seus magníficos mistérios. Ingressar no projeto de pesquisa chefiado pelo professor Antônio Câmara (que tinha como objetivo analisar sociologicamente filmes brasileiros de temática rural) foi um divisor de águas nos meus anos de graduação na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA. O enriquecedor contato com este grupo levou-me a cursar a disciplina Sociologia da Arte, onde se confirmou uma inclinação pessoal para o estudo referente aos conteúdos da sociologia da literatura. Devido ao teor notavelmente crítico dos seus escritos, Kafka logo surgiu como um objeto de análise promissor. Depois de muito debate definimos que a melhor direção a ser tomada na composição da minha monografia seria buscar interpretar o romance O Processo à luz do conceito de alienação desenvolvido por Marx. A metodologia construída para dar conta desse objetivo mostrou-se bastante eficaz e posso dizer que o trabalho foi muito bem recebido. Para a dissertação, portanto, resolvemos manter Kafka como objeto de estudo, mas faltava ainda decidir sob qual perspectiva iríamos abordar o autor desta vez. Não demorou muito para percebermos que um dos elementos mais significativos da sua literatura era ao mesmo tempo um tema sociológico por excelência: a burocracia – e o romance O Castelo seria o mais adequado para essa abordagem. Seguindo uma orientação teórica marxista podemos observar a rica possibilidade de diálogo entre essa obra e a discussão da escola de Frankfurt em torno da razão subjetiva. Para tornar o nosso referencial teórico mais completo optamos por realizar uma discussão sobre a Razão no pensamento de Hegel, com a intenção de construir um pano de fundo filosófico que nos ajude a compreender melhor as ponderações empreendidas por Adorno e Horkheimer na crítica desses autores às sociedades modernas. Mesmo partindo de uma perspectiva distinta da weberiana sobre a sociedade capitalista, nos pareceu adequado dialogar criticamente com este autor para compreendermos o processo de racionalização ocorrido nos países ocidentais, assim como o fortalecimento da dominação burocrática nessas culturas. Além disso, ampliamos o debate a respeito da sociologia da literatura em Lukács, Goldmann e outros autores no intuito de aprofundar a nossa abordagem estética em relação ao que já havíamos feito no trabalho de conclusão de curso. Conscientes das dificuldades dessa empreitada nos lançamos no desafio de mais uma vez adentrarmos o estranho universo literário de Kafka. Levando em consideração as peculiaridades do nosso objeto de estudo, acreditamos ser necessária a realização de algumas reflexões preliminares importantes. Para que a posição desta pesquisa não pareça nebulosa quanto ao seu conteúdo propriamente artístico, é preciso dizer que compartilhamos do postulado apresentado por Arnold Hauser na obra The Philosophy of Art History (1985), de que todo tipo de arte é invariavelmente condicionado pelo meio social no qual surgiu, mas que, por outro lado, nem tudo numa obra de arte pode ser compreendido utilizando o viés sociológico. Se nos propomos a analisar uma obra literária à luz de conceitos da Sociologia, não podemos em hipótese alguma, perder de vista o fato da arte produzir um conhecimento sensível, no qual a subjetividade e a individualidade são fundamentais. Logo os seus resultados não são similares àqueles produzidos pela ciência, pois eles não constituem conceitos. O que não impede a ciência de se debruçar sobre estes, respeitando sua singularidade, mas buscando apreendê-los no âmbito da totalidade social. Temos plena consciência de que deixar de lado tal fator significa negar à obra que se pretende estudar aquilo que ela possui de mais característico, quer dizer, a sua personalidade estética, que se relaciona com o homem num nível bastante distinto daquele alcançado pela ciência através dos procedimentos discursivos. Reconhecer que o fenômeno artístico, dado a sua indiscutível complexidade, só pode ser parcialmente apreendido pelo conhecimento cientifico, não quer dizer que estejamos querendo lhe atribuir um caráter místico ou fetichizado, e sim que procuramos evitar o empobrecimento da análise admitindo a especificidade desta manifestação. Em contrapartida, durante uma determinada época tornou-se um procedimento comum a diversos estudiosos desta forma de expressão, acreditar que a história da arte se desenvolve de maneira independente dos movimentos da história humana. Por mais que seja errôneo interpretá-lo como um mero reflexo da sociedade, não há como negar que a arte é um aspecto integrante e ativo da história geral do homem. Se subtrairmos completamente a atividade artística do âmbito da história, estaremos fatalmente atribuindo-lhe um caráter abstrato, quase sobrenatural, quando na verdade acreditamos na existência de ligações objetivas entre estas duas instâncias. Encarar a arte livre de qualquer influência que não tenha surgido do seu próprio movimento, leva à idéia de que a melhor maneira de analisá-la seja investigando a personalidade do seu criador. Porém, a psicologia vem se mostrando insuficiente para a compreensão do fenômeno artístico. Uma investigação que tenha o objetivo de compreender como estão estruturadas as condições materiais da época em que o artista viveu nos parece muito mais frutífera do que o complicado desvendamento das suas intenções subjetivas. Por este motivo acreditamos que o procedimento mais acertado para a análise deste objeto seja aquele que procure apreender como as condições objetivas refletem-se nos homens historicamente situados e de que maneira isso se transmite ao próprio ato da criação artística. Essa discussão é essencial na medida em que compreender a arte apartada da história significa considerá-la isenta das influências do meio social. Leandro Konder nos lembra que se fosse desta forma este fenômeno provavelmente já teria desaparecido cedendo lugar à técnica, devido à importância que a burguesia atribui aos objetos úteis, o que certamente não corresponde ao caráter da arte. O debate serve também para justificar a nossa adoção do método de análise utilizado por Lukács, em especial no livro A Teoria do Romance. Lukács tinha conhecimento de que conteúdo e forma não devem ser compreendidos de modo inteiramente separado, mas ele foi muito além deste aspecto, enxergando a maneira com a qual o sistema capitalista burguês afeta justamente aquilo que mantém estas duas categorias integradas, ou seja, a consciência do artista. Ao analisar as formas literárias, de maneira especial o romance, este filósofo procurou observar os métodos utilizados pelos escritores do século XIX na composição de suas obras, enfatizando a existência de elementos objetivos imprescindíveis a esta composição que estão além da vontade individual do artista, dando ao cientista social algo sólido com que trabalhar. Seria este, portanto, o nosso ponto de partida metodológico. Chamamos atenção ainda, para o fato de a literatura guardar uma diferença bastante significativa em relação aos outros tipos de arte. Não é raro que em determinadas sentenças ou expressões encontremos separados o artista do escritor; o título do famoso livro de Hauser é um exemplo claro disso: História Social da Arte e da Literatura. Ao que sabemos esta separação se deve principalmente à forte presença do elemento discursivo no processo de criação estética de uma obra literária. Isso não quer dizer, contudo, que a análise científica de um romance seja de alguma maneira facilitada, pois na grande literatura o discurso se converte invariavelmente em um meio de expressar sensações que, sem o talento artístico do escritor, nunca seria devidamente atingido. Com isso em mente decidimos dividir o nosso trabalho em quatro capítulos, buscando abrigar a discussão necessária para a construção de um panorama teórico-metodológico que nos auxilie a estabelecer um diálogo entre o romance O Castelo e os autores citados acima. No primeiro capítulo buscaremos efetuar uma análise da biografia de Kafka, e das muitas interpretações a respeito da sua obra. Nossa finalidade é construir um painel que dê conta de elementos que consideramos importantes na sua vida, como a situação dos judeus em Praga e a conturbada relação deste escritor com seu pai, dando ênfase ao período em que o romance O Castelo foi escrito. Estes elementos são importantes, porém não serão determinantes na leitura da obra. Pretendemos também realizar um exame cuidadoso do contexto histórico no qual o escritor viveu, destacando os processos políticos, econômicos, e ideológicos que estavam em questão na Áustria do início do século XX. Ao ressaltar as principais tendências críticas da obra de Kafka, pretendemos, além de expor os prós e os contras de cada uma, situar também a nossa própria perspectiva, adiantando parte do procedimento metodológico. Já no capítulo dois temos como objetivo analisar o conteúdo referente à sociologia da literatura especialmente nas obras de Lukács, Goldmann e Adorno. Em sua conhecida obra A Teoria do Romance Lukács procurou mostrar as possibilidades de conexão entre uma compreensão do contexto histórico e o estudo estético das obras literárias. Como já dissemos anteriormente a metodologia aqui utilizada deve muito à contribuição desse autor para a análise literária. Anos depois Lucien Goldmann retoma as categorias trabalhadas por Lukács, buscando adaptá-las para a compreensão do chamado romance moderno. Ele propõe a hipótese sociológica de que existem ligações objetivas entre o modo de produção das sociedades e a estrutura dos romances. Com Adorno aprofundaremos a discussão sobre as mudanças ocorridas na composição deste estilo literário com a transição do capitalismo liberal para o imperialista. O terceiro capítulo por sua vez será dedicado à discussão teórica sobre a Razão, utilizando autores como Hegel, Adorno, Horkheimer e Weber. Dissemos como o primeiro nos dará uma base filosófica para compreender o movimento da razão: seu momento objetivo e a sua posterior subjetivação. A razão em Hegel caminha para uma unidade entre a razão objetiva e a subjetiva. Com Adorno e Horkheimer veremos os malefícios causados pela perda de objetividade deste conceito. Ao empreenderem uma crítica incisiva da modernidade e dos potenciais destrutivos da razão humana, eles mostraram como se tornou possível a atual crise de valores vivenciada pelas sociedades ocidentais. Mesmo assumindo o ponto de vista da razão subjetiva, Weber revelou aspectos bastante importantes do processo de desencantamento do mundo e da acelerada burocratização da realidade social. Porém, nesse sociólogo antes de termos uma discussão acerca da razão, vemos uma análise da racionalização. Chegamos por fim ao último capítulo no qual analisamos o romance O Castelo. Seguindo o método utilizado na monografia buscaremos eleger algumas passagens que consideramos pontos altos da narrativa de Kafka, avaliando-as à luz dos autores estudados nos capítulos anteriores. Este é o momento de efetuar uma triangulação dos elementos observados no nosso objeto, com as informações provindas das discussões teóricas (tanto no que se refere à razão quanto à sociologia da literatura), e as reflexões realizadas a partir da análise do contexto histórico. É importante observar também que o nosso ponto de partida é o próprio texto do romance, que será tratado com extremo cuidado pelas próprias peculiaridades da composição labiríntica desenvolvida pelo escritor de Praga. Com isso procuraremos evitar qualquer tipo de conclusão que tome como base informações não encontradas no corpo integral da obra.Submitted by Oliveira Santos Dilzaná (dilznana@yahoo.com.br) on 2014-04-25T11:58:43Z No. of bitstreams: 1 Dissertaçãode Bruno Andrade de Sampaio Neto.pdf: 908513 bytes, checksum: ab78e23e1fabeb1d3d15f13b9b557aaa (MD5)Approved for entry into archive by Ana Portela (anapoli@ufba.br) on 2014-05-06T14:09:45Z (GMT) No. of bitstreams: 1 Dissertaçãode Bruno Andrade de Sampaio Neto.pdf: 908513 bytes, checksum: ab78e23e1fabeb1d3d15f13b9b557aaa (MD5)Made available in DSpace on 2014-05-06T14:09:45Z (GMT). No. of bitstreams: 1 Dissertaçãode Bruno Andrade de Sampaio Neto.pdf: 908513 bytes, checksum: ab78e23e1fabeb1d3d15f13b9b557aaa (MD5)SociologiaSociologiaFrankfurt, Escola de SociologiaBurocraciaRacionalizaçãoKafka, FranzLiteraturaA face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafkainfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisFaculdade de Filosofia e Ciências HumanasPrograma de Pós-Graduação em Ciências SociaisFFCH - PPGCSbrasilinfo:eu-repo/semantics/openAccessporreponame:Repositório Institucional da UFBAinstname:Universidade Federal da Bahia (UFBA)instacron:UFBALICENSElicense.txtlicense.txttext/plain1345https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/14917/2/license.txt0d4b811ef71182510d2015daa7c8a900MD52ORIGINALDissertaçãode Bruno Andrade de Sampaio Neto.pdfDissertaçãode Bruno Andrade de Sampaio Neto.pdfapplication/pdf908513https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/14917/1/Disserta%c3%a7%c3%a3ode%20Bruno%20Andrade%20de%20Sampaio%20Neto.pdfab78e23e1fabeb1d3d15f13b9b557aaaMD51TEXTDissertaçãode Bruno Andrade de Sampaio Neto.pdf.txtDissertaçãode Bruno Andrade de Sampaio Neto.pdf.txtExtracted texttext/plain398402https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/14917/3/Disserta%c3%a7%c3%a3ode%20Bruno%20Andrade%20de%20Sampaio%20Neto.pdf.txt750cf555bab61146b9aff42c242b08c3MD53ri/149172022-07-05 14:02:51.268oai:repositorio.ufba.br:ri/14917VGVybW8gZGUgTGljZW4/YSwgbj9vIGV4Y2x1c2l2bywgcGFyYSBvIGRlcD9zaXRvIG5vIFJlcG9zaXQ/cmlvIEluc3RpdHVjaW9uYWwgZGEgVUZCQS4KCiBQZWxvIHByb2Nlc3NvIGRlIHN1Ym1pc3M/byBkZSBkb2N1bWVudG9zLCBvIGF1dG9yIG91IHNldSByZXByZXNlbnRhbnRlIGxlZ2FsLCBhbyBhY2VpdGFyIAplc3NlIHRlcm1vIGRlIGxpY2VuP2EsIGNvbmNlZGUgYW8gUmVwb3NpdD9yaW8gSW5zdGl0dWNpb25hbCBkYSBVbml2ZXJzaWRhZGUgRmVkZXJhbCBkYSBCYWhpYSAKbyBkaXJlaXRvIGRlIG1hbnRlciB1bWEgYz9waWEgZW0gc2V1IHJlcG9zaXQ/cmlvIGNvbSBhIGZpbmFsaWRhZGUsIHByaW1laXJhLCBkZSBwcmVzZXJ2YT8/by4gCkVzc2VzIHRlcm1vcywgbj9vIGV4Y2x1c2l2b3MsIG1hbnQ/bSBvcyBkaXJlaXRvcyBkZSBhdXRvci9jb3B5cmlnaHQsIG1hcyBlbnRlbmRlIG8gZG9jdW1lbnRvIApjb21vIHBhcnRlIGRvIGFjZXJ2byBpbnRlbGVjdHVhbCBkZXNzYSBVbml2ZXJzaWRhZGUuCgogUGFyYSBvcyBkb2N1bWVudG9zIHB1YmxpY2Fkb3MgY29tIHJlcGFzc2UgZGUgZGlyZWl0b3MgZGUgZGlzdHJpYnVpPz9vLCBlc3NlIHRlcm1vIGRlIGxpY2VuP2EgCmVudGVuZGUgcXVlOgoKIE1hbnRlbmRvIG9zIGRpcmVpdG9zIGF1dG9yYWlzLCByZXBhc3NhZG9zIGEgdGVyY2Vpcm9zLCBlbSBjYXNvIGRlIHB1YmxpY2E/P2VzLCBvIHJlcG9zaXQ/cmlvCnBvZGUgcmVzdHJpbmdpciBvIGFjZXNzbyBhbyB0ZXh0byBpbnRlZ3JhbCwgbWFzIGxpYmVyYSBhcyBpbmZvcm1hPz9lcyBzb2JyZSBvIGRvY3VtZW50bwooTWV0YWRhZG9zIGVzY3JpdGl2b3MpLgoKIERlc3RhIGZvcm1hLCBhdGVuZGVuZG8gYW9zIGFuc2Vpb3MgZGVzc2EgdW5pdmVyc2lkYWRlIGVtIG1hbnRlciBzdWEgcHJvZHU/P28gY2llbnQ/ZmljYSBjb20gCmFzIHJlc3RyaT8/ZXMgaW1wb3N0YXMgcGVsb3MgZWRpdG9yZXMgZGUgcGVyaT9kaWNvcy4KCiBQYXJhIGFzIHB1YmxpY2E/P2VzIHNlbSBpbmljaWF0aXZhcyBxdWUgc2VndWVtIGEgcG9sP3RpY2EgZGUgQWNlc3NvIEFiZXJ0bywgb3MgZGVwP3NpdG9zIApjb21wdWxzP3Jpb3MgbmVzc2UgcmVwb3NpdD9yaW8gbWFudD9tIG9zIGRpcmVpdG9zIGF1dG9yYWlzLCBtYXMgbWFudD9tIGFjZXNzbyBpcnJlc3RyaXRvIAphbyBtZXRhZGFkb3MgZSB0ZXh0byBjb21wbGV0by4gQXNzaW0sIGEgYWNlaXRhPz9vIGRlc3NlIHRlcm1vIG4/byBuZWNlc3NpdGEgZGUgY29uc2VudGltZW50bwogcG9yIHBhcnRlIGRlIGF1dG9yZXMvZGV0ZW50b3JlcyBkb3MgZGlyZWl0b3MsIHBvciBlc3RhcmVtIGVtIGluaWNpYXRpdmFzIGRlIGFjZXNzbyBhYmVydG8uCg==Repositório InstitucionalPUBhttp://192.188.11.11:8080/oai/requestopendoar:19322022-07-05T17:02:51Repositório Institucional da UFBA - Universidade Federal da Bahia (UFBA)false
dc.title.pt_BR.fl_str_mv A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
title A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
spellingShingle A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
Sampaio Neto, Bruno Andrade de
Sociologia
Sociologia
Frankfurt, Escola de Sociologia
Burocracia
Racionalização
Kafka, Franz
Literatura
title_short A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
title_full A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
title_fullStr A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
title_full_unstemmed A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
title_sort A face irracional da burocratização no romance o castelo de Kafka
author Sampaio Neto, Bruno Andrade de
author_facet Sampaio Neto, Bruno Andrade de
author_role author
dc.contributor.author.fl_str_mv Sampaio Neto, Bruno Andrade de
Sampaio Neto, Bruno Andrade de
dc.contributor.advisor1.fl_str_mv Câmara, Antônio da Silva
dc.contributor.referee1.fl_str_mv Moura, Mauro Castelo Branco de
Cardel, Lídia Maria Pires Soares
Câmara, Antônio da Silva
contributor_str_mv Câmara, Antônio da Silva
Moura, Mauro Castelo Branco de
Cardel, Lídia Maria Pires Soares
Câmara, Antônio da Silva
dc.subject.cnpq.fl_str_mv Sociologia
topic Sociologia
Sociologia
Frankfurt, Escola de Sociologia
Burocracia
Racionalização
Kafka, Franz
Literatura
dc.subject.por.fl_str_mv Sociologia
Frankfurt, Escola de Sociologia
Burocracia
Racionalização
Kafka, Franz
Literatura
description A idéia para a presente pesquisa surgiu como um caminho natural da minha trajetória acadêmica que em determinado momento encontrou nas discussões da Sociologia da Arte os anseios intelectuais de um aspirante a sociólogo fascinado pelo universo artístico e os seus magníficos mistérios. Ingressar no projeto de pesquisa chefiado pelo professor Antônio Câmara (que tinha como objetivo analisar sociologicamente filmes brasileiros de temática rural) foi um divisor de águas nos meus anos de graduação na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA. O enriquecedor contato com este grupo levou-me a cursar a disciplina Sociologia da Arte, onde se confirmou uma inclinação pessoal para o estudo referente aos conteúdos da sociologia da literatura. Devido ao teor notavelmente crítico dos seus escritos, Kafka logo surgiu como um objeto de análise promissor. Depois de muito debate definimos que a melhor direção a ser tomada na composição da minha monografia seria buscar interpretar o romance O Processo à luz do conceito de alienação desenvolvido por Marx. A metodologia construída para dar conta desse objetivo mostrou-se bastante eficaz e posso dizer que o trabalho foi muito bem recebido. Para a dissertação, portanto, resolvemos manter Kafka como objeto de estudo, mas faltava ainda decidir sob qual perspectiva iríamos abordar o autor desta vez. Não demorou muito para percebermos que um dos elementos mais significativos da sua literatura era ao mesmo tempo um tema sociológico por excelência: a burocracia – e o romance O Castelo seria o mais adequado para essa abordagem. Seguindo uma orientação teórica marxista podemos observar a rica possibilidade de diálogo entre essa obra e a discussão da escola de Frankfurt em torno da razão subjetiva. Para tornar o nosso referencial teórico mais completo optamos por realizar uma discussão sobre a Razão no pensamento de Hegel, com a intenção de construir um pano de fundo filosófico que nos ajude a compreender melhor as ponderações empreendidas por Adorno e Horkheimer na crítica desses autores às sociedades modernas. Mesmo partindo de uma perspectiva distinta da weberiana sobre a sociedade capitalista, nos pareceu adequado dialogar criticamente com este autor para compreendermos o processo de racionalização ocorrido nos países ocidentais, assim como o fortalecimento da dominação burocrática nessas culturas. Além disso, ampliamos o debate a respeito da sociologia da literatura em Lukács, Goldmann e outros autores no intuito de aprofundar a nossa abordagem estética em relação ao que já havíamos feito no trabalho de conclusão de curso. Conscientes das dificuldades dessa empreitada nos lançamos no desafio de mais uma vez adentrarmos o estranho universo literário de Kafka. Levando em consideração as peculiaridades do nosso objeto de estudo, acreditamos ser necessária a realização de algumas reflexões preliminares importantes. Para que a posição desta pesquisa não pareça nebulosa quanto ao seu conteúdo propriamente artístico, é preciso dizer que compartilhamos do postulado apresentado por Arnold Hauser na obra The Philosophy of Art History (1985), de que todo tipo de arte é invariavelmente condicionado pelo meio social no qual surgiu, mas que, por outro lado, nem tudo numa obra de arte pode ser compreendido utilizando o viés sociológico. Se nos propomos a analisar uma obra literária à luz de conceitos da Sociologia, não podemos em hipótese alguma, perder de vista o fato da arte produzir um conhecimento sensível, no qual a subjetividade e a individualidade são fundamentais. Logo os seus resultados não são similares àqueles produzidos pela ciência, pois eles não constituem conceitos. O que não impede a ciência de se debruçar sobre estes, respeitando sua singularidade, mas buscando apreendê-los no âmbito da totalidade social. Temos plena consciência de que deixar de lado tal fator significa negar à obra que se pretende estudar aquilo que ela possui de mais característico, quer dizer, a sua personalidade estética, que se relaciona com o homem num nível bastante distinto daquele alcançado pela ciência através dos procedimentos discursivos. Reconhecer que o fenômeno artístico, dado a sua indiscutível complexidade, só pode ser parcialmente apreendido pelo conhecimento cientifico, não quer dizer que estejamos querendo lhe atribuir um caráter místico ou fetichizado, e sim que procuramos evitar o empobrecimento da análise admitindo a especificidade desta manifestação. Em contrapartida, durante uma determinada época tornou-se um procedimento comum a diversos estudiosos desta forma de expressão, acreditar que a história da arte se desenvolve de maneira independente dos movimentos da história humana. Por mais que seja errôneo interpretá-lo como um mero reflexo da sociedade, não há como negar que a arte é um aspecto integrante e ativo da história geral do homem. Se subtrairmos completamente a atividade artística do âmbito da história, estaremos fatalmente atribuindo-lhe um caráter abstrato, quase sobrenatural, quando na verdade acreditamos na existência de ligações objetivas entre estas duas instâncias. Encarar a arte livre de qualquer influência que não tenha surgido do seu próprio movimento, leva à idéia de que a melhor maneira de analisá-la seja investigando a personalidade do seu criador. Porém, a psicologia vem se mostrando insuficiente para a compreensão do fenômeno artístico. Uma investigação que tenha o objetivo de compreender como estão estruturadas as condições materiais da época em que o artista viveu nos parece muito mais frutífera do que o complicado desvendamento das suas intenções subjetivas. Por este motivo acreditamos que o procedimento mais acertado para a análise deste objeto seja aquele que procure apreender como as condições objetivas refletem-se nos homens historicamente situados e de que maneira isso se transmite ao próprio ato da criação artística. Essa discussão é essencial na medida em que compreender a arte apartada da história significa considerá-la isenta das influências do meio social. Leandro Konder nos lembra que se fosse desta forma este fenômeno provavelmente já teria desaparecido cedendo lugar à técnica, devido à importância que a burguesia atribui aos objetos úteis, o que certamente não corresponde ao caráter da arte. O debate serve também para justificar a nossa adoção do método de análise utilizado por Lukács, em especial no livro A Teoria do Romance. Lukács tinha conhecimento de que conteúdo e forma não devem ser compreendidos de modo inteiramente separado, mas ele foi muito além deste aspecto, enxergando a maneira com a qual o sistema capitalista burguês afeta justamente aquilo que mantém estas duas categorias integradas, ou seja, a consciência do artista. Ao analisar as formas literárias, de maneira especial o romance, este filósofo procurou observar os métodos utilizados pelos escritores do século XIX na composição de suas obras, enfatizando a existência de elementos objetivos imprescindíveis a esta composição que estão além da vontade individual do artista, dando ao cientista social algo sólido com que trabalhar. Seria este, portanto, o nosso ponto de partida metodológico. Chamamos atenção ainda, para o fato de a literatura guardar uma diferença bastante significativa em relação aos outros tipos de arte. Não é raro que em determinadas sentenças ou expressões encontremos separados o artista do escritor; o título do famoso livro de Hauser é um exemplo claro disso: História Social da Arte e da Literatura. Ao que sabemos esta separação se deve principalmente à forte presença do elemento discursivo no processo de criação estética de uma obra literária. Isso não quer dizer, contudo, que a análise científica de um romance seja de alguma maneira facilitada, pois na grande literatura o discurso se converte invariavelmente em um meio de expressar sensações que, sem o talento artístico do escritor, nunca seria devidamente atingido. Com isso em mente decidimos dividir o nosso trabalho em quatro capítulos, buscando abrigar a discussão necessária para a construção de um panorama teórico-metodológico que nos auxilie a estabelecer um diálogo entre o romance O Castelo e os autores citados acima. No primeiro capítulo buscaremos efetuar uma análise da biografia de Kafka, e das muitas interpretações a respeito da sua obra. Nossa finalidade é construir um painel que dê conta de elementos que consideramos importantes na sua vida, como a situação dos judeus em Praga e a conturbada relação deste escritor com seu pai, dando ênfase ao período em que o romance O Castelo foi escrito. Estes elementos são importantes, porém não serão determinantes na leitura da obra. Pretendemos também realizar um exame cuidadoso do contexto histórico no qual o escritor viveu, destacando os processos políticos, econômicos, e ideológicos que estavam em questão na Áustria do início do século XX. Ao ressaltar as principais tendências críticas da obra de Kafka, pretendemos, além de expor os prós e os contras de cada uma, situar também a nossa própria perspectiva, adiantando parte do procedimento metodológico. Já no capítulo dois temos como objetivo analisar o conteúdo referente à sociologia da literatura especialmente nas obras de Lukács, Goldmann e Adorno. Em sua conhecida obra A Teoria do Romance Lukács procurou mostrar as possibilidades de conexão entre uma compreensão do contexto histórico e o estudo estético das obras literárias. Como já dissemos anteriormente a metodologia aqui utilizada deve muito à contribuição desse autor para a análise literária. Anos depois Lucien Goldmann retoma as categorias trabalhadas por Lukács, buscando adaptá-las para a compreensão do chamado romance moderno. Ele propõe a hipótese sociológica de que existem ligações objetivas entre o modo de produção das sociedades e a estrutura dos romances. Com Adorno aprofundaremos a discussão sobre as mudanças ocorridas na composição deste estilo literário com a transição do capitalismo liberal para o imperialista. O terceiro capítulo por sua vez será dedicado à discussão teórica sobre a Razão, utilizando autores como Hegel, Adorno, Horkheimer e Weber. Dissemos como o primeiro nos dará uma base filosófica para compreender o movimento da razão: seu momento objetivo e a sua posterior subjetivação. A razão em Hegel caminha para uma unidade entre a razão objetiva e a subjetiva. Com Adorno e Horkheimer veremos os malefícios causados pela perda de objetividade deste conceito. Ao empreenderem uma crítica incisiva da modernidade e dos potenciais destrutivos da razão humana, eles mostraram como se tornou possível a atual crise de valores vivenciada pelas sociedades ocidentais. Mesmo assumindo o ponto de vista da razão subjetiva, Weber revelou aspectos bastante importantes do processo de desencantamento do mundo e da acelerada burocratização da realidade social. Porém, nesse sociólogo antes de termos uma discussão acerca da razão, vemos uma análise da racionalização. Chegamos por fim ao último capítulo no qual analisamos o romance O Castelo. Seguindo o método utilizado na monografia buscaremos eleger algumas passagens que consideramos pontos altos da narrativa de Kafka, avaliando-as à luz dos autores estudados nos capítulos anteriores. Este é o momento de efetuar uma triangulação dos elementos observados no nosso objeto, com as informações provindas das discussões teóricas (tanto no que se refere à razão quanto à sociologia da literatura), e as reflexões realizadas a partir da análise do contexto histórico. É importante observar também que o nosso ponto de partida é o próprio texto do romance, que será tratado com extremo cuidado pelas próprias peculiaridades da composição labiríntica desenvolvida pelo escritor de Praga. Com isso procuraremos evitar qualquer tipo de conclusão que tome como base informações não encontradas no corpo integral da obra.
publishDate 2012
dc.date.submitted.none.fl_str_mv 2012-08-06
dc.date.accessioned.fl_str_mv 2014-05-06T14:09:45Z
dc.date.available.fl_str_mv 2014-05-06T14:09:45Z
dc.date.issued.fl_str_mv 2014-05-06
dc.type.status.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/publishedVersion
dc.type.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/masterThesis
format masterThesis
status_str publishedVersion
dc.identifier.uri.fl_str_mv http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/14917
url http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/14917
dc.language.iso.fl_str_mv por
language por
dc.rights.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/openAccess
eu_rights_str_mv openAccess
dc.publisher.none.fl_str_mv Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas
dc.publisher.program.fl_str_mv Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
dc.publisher.initials.fl_str_mv FFCH - PPGCS
dc.publisher.country.fl_str_mv brasil
publisher.none.fl_str_mv Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas
dc.source.none.fl_str_mv reponame:Repositório Institucional da UFBA
instname:Universidade Federal da Bahia (UFBA)
instacron:UFBA
instname_str Universidade Federal da Bahia (UFBA)
instacron_str UFBA
institution UFBA
reponame_str Repositório Institucional da UFBA
collection Repositório Institucional da UFBA
bitstream.url.fl_str_mv https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/14917/2/license.txt
https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/14917/1/Disserta%c3%a7%c3%a3ode%20Bruno%20Andrade%20de%20Sampaio%20Neto.pdf
https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/14917/3/Disserta%c3%a7%c3%a3ode%20Bruno%20Andrade%20de%20Sampaio%20Neto.pdf.txt
bitstream.checksum.fl_str_mv 0d4b811ef71182510d2015daa7c8a900
ab78e23e1fabeb1d3d15f13b9b557aaa
750cf555bab61146b9aff42c242b08c3
bitstream.checksumAlgorithm.fl_str_mv MD5
MD5
MD5
repository.name.fl_str_mv Repositório Institucional da UFBA - Universidade Federal da Bahia (UFBA)
repository.mail.fl_str_mv
_version_ 1793970559665569792